D'APRÈS Um Vicente, algures entre LISBOA - LONDRES - XANGAI - BRUXELAS

quinta-feira, novembro 10

Mosteiro Ortodoxo e Cultura Helénica, Sul da Albânia

Good old chaps!

Deste 2º post da "saga Albânia", mais curto que o primeiro, ficam principalmente as fotos. Foram tiradas nos arredores da cidade de Apolloni, localizada na costa sul do país numa zona que os gregos reclamam desde há muito como território helénico.

Segundo os meus (calorosos) anfitriões, a zona em redor deste templo foi descrita na Odisseia. Tal como aconteceu com Olissipo, o Ulisses também andou por estas bandas a ver se encontrava algum tasco de jeito :p Segundo a história, toda a planície que se estende até ao mar (ver a última foto) estava coberta de água há umas centenas de anos atrás e os barcos atracavam directamente no cimo do monte, de onde tirei a foto.

Na zona ocupada pelas ruínas de um templo, um anfiteatro e a estrutura de um fórum também se encontravam as inevitáveis oliveiras, que dão um toque tão mediterrânico ao sítio! O local era encantador, apesar de algo degradado. Com um projecto de recuperação dava uma atracção óptima para o turismo. Ao lado das ruínas do templo helénico encontra-se também um mosteiro ortodoxo, que podem observar na maioria das fotos abaixo.





A visita deste dia terminou com mais uma bela refeição e uma sensação olímpica de satisfação. O regresso a Tirana, por estradas que metem medo ao susto, fez-me lembrar uma música já antiga dos GNR com a vozinha do Rui Reininho a entoar "Tirana é um lugar, difícil de encontrar...".

Dia seguinte foi regresso à gostosa rotina de Bruxelas!

Centro de Tirana, Albânia

Olá pessoal

Deixando para trás a confusão que se vai instalando pela França e Bélgica (ainda ontem incendiaram uns quantos carros e árvores em Bruxelas) fui, na semana que agora finda, dar um pulo a um dos países acerca do qual menos se sabe na Europa.

Da Albânia o que normalmente se ouve falar hoje em dia é da pobreza, do crime e corrupção, da emigração massiva para Itália (lembram-se das fotos da Benetton no princípio dos anos 90?) ou da Madre Teresa de Calcutá, que dá o nome ao aeroporto internacional. E de ser um dos únicos países da Europa onde a religião muçulmana é dominante.

Do passado, a ocupação turca durante 500 anos e o facto de ter sido o único país da Europa de Leste de influência maoísta que se escapou sem a clássica invasão de tanques soviéticos e deposição rápida do regime no poder. A H(h)istória é no mínimo curiosa, em 1960 o "famoso" líder Enver Hoxha (que governou o país desde a 2a Guerra Mundial até à sua morte em 1985) rompeu com o regime do Khruschev e abandonou completamente o Pacto de Varsóvia em 1968 depois da Primavera de Praga. Pôde fazer isso com certeza porque tinha o apoio da China, que abasteceu o país de cereais, construiu inúmeras fábricas, trouxe médicos e isto constituiu uma melhoria considerável das condições de vida em comparação com o período anterior (isto foi-me descrito pelos proprios albaneses). Tudo no enquadramento do sistema de planeamento central, como é óbvio. Este "bem-bom" acabou com a entrada em cena do Deng Xiao Ping na China e a mudança de política por volta de 1978. Mas a influência da Revolução Cultural e das ideias maoístas em geral foi grande no país, pergunto-me o que pensariam na altura acerca deste regime os maoístas portugueses...

O processo de liberalização política e mais tarde económica começou depois da morte do Hoxha em 1985. Até aos nossos dias houve vários avanços e retrocessos, mas o caminho actual parece ser o de uma cada vez maior aproximação com o Ocidente. Não só à União Europeia mas também aos EUA, até houve um apoio explícito à "Coalition of the Willing" no Iraque! Como as coisas mudam...

De Tirana acebei por ver fundamentalmente o centro. A praça que vem na 1ª foto (tirada da janela do hotel) chama-se praça da Europa. O edifício enorme do lado esquerdo é o da Ópera de Tirana. A julgar pelo tamanho do edifício, os albaneses devem gostar realmente muito de Ópera! Esta semana estava a passar o Rigoletto. Como podem ver a praça tem um ar agradável, tal como várias outras nesta zona. Há muitas árvores (a maioria ciprestes) e várias zonas verdes, com cafés e esplanadas. O centro tem um ar pacífico, o que honestamente não estava à espera de encontrar. Duas características péssimas são o estado das estradas (ainda pior que Lisboa antes de entrar para a CEE) e a poluição do ar!

Outra coisa que me surpreendeu foi o parque automóvel. É óbvio que num país como a Albânia, que se pode considerar em vias de desenvolvimento, não se está à espera de encontrar o mesmo que em Lisboa ou Bruxelas. Mas a quantidade de Mercedes e BMW era considerável, e na estrada do aeroporto para o centro vêem-se bastantes stands de várias marcas. Podem-me dizer que a maioria são carros comprados em 2ª mão e que entraram no país ilegalmente, ou que o pessoal que os compra anda metido em tráficos de todo o género. Mas a verdade é que há muitos, tal como telemóveis.

A foto a seguir mostra atrás os edifícios dos Ministérios, com o amarelo e vermelho como cores dominantes. Isto marca uma diferença com o estilo soviético de edifícios cinzentões com ar de fortaleza. Os edifícios e casas particulares em Tirana e noutras zonas do país são normalmente coloridos, principalmente as casas novas. Pelo que me disseram porque neste aspecto as influências mediterrânicas são mais fortes que as que vinham do leste da Europa. E há muita construção, este sector parece que tem sido o mais dinâmico da economia nos últimos anos. Não só obras públicas financiadas por "international donors" mas também casas particulares com o dinheiro mais ou menos legitimamente obtido pelos emigrantes na Itália ou Grécia. Neste particular, tal como no dos carros, devo dizer que me pareceu que Tirana e arredores estão em melhores condições do que Belgrado, que visitei no ano passado. É evidente que Belgrado é maior e deve ser mais rica, que já passou um ano e nestes países as coisas têm mudado rápido, mas o ano passado ainda se viam trabants na capital da Sérvia e a renovação urbana pareceu-me praticamente inexistente.

Outro pormenor da foto, que não sei se conseguem observar, são alguns tipos que andam por ali com enormes maços de notas na mão a oferecer aos passantes. Isto foi algo que me intrigou, ainda para mais mesmo à frente dos Ministérios e do centro do poder político! De onde vem o interesse do negócio (que também se pode ver nas outras cidades da Albânia que visitei), dado que os turistas que visitam o país hoje em dia sao pouquíssimos, fora os albaneses expatriados? Ora, parece que o negócio vem mesmo destes: boa parte dos emigrantes envia remessas às familias na Albânia em moeda estrangeira (euros, libras, dólares...) e são estes que preferem trocar na rua em vez de nos bancos porque conseguem melhor taxa cambial. Claro que de vez em quando devem levar com notas falsas, mas isso e outra estória...

Para terminar os comentários a esta foto, só dizer que a estátua é a do herói nacional, o Skandenberg, que há umas centenas de anos atrás resistiu à invasão turca.

O edifício acima é o do museu da cidade que, a julgar pela pintura na entrada principal, ainda celebra algumas das conquistas revolucionárias do povo. Passado, presente e futuro na mesma praça...

Nas fotos abaixo aparece o edifício da mesquita e a torre do relógio, que são as principais marcas da religião muçulmana (de maioria sunita) que encontrei em Tirana. Têm um ar giro mas os cânticos religiosos que eram emitidos em alto som às 5 da manhã atazanaram-me um bocado o juízo! A propósito da religião, devo dizer que me pareceu que não tem a mesma força que em outros países de maioria muçulmana. O pessoal jovem, particularmente mulheres, veste-se de forma perfeitamente ocidentalizada, bebe alcoól e da minha observação necessariamente superficial (que se limitou à parte nobre de Tirana e a cidades da costa e sul do país, de forte influência cristã ortodoxa e portanto mais próxima do ocidente) não me pareceu haver traços de forte conservadorismo. Suponho que a religião por estas bandas ocupa o mesmo lugar da cristã em Portugal ou noutros países europeus.


Para rematar este post, só dizer que a comida albanesa é óptima! A cozinha tradicional é de forte influência turca e grega (tal como a cultura e sentimento da população em geral), mas a quantidade de restaurantes italianos que começa a aparecer é enorme. Eu acabei por provar uma bela perna de borrego que, segundo me contaram, vem de animais que só comem erva e são criados em pastagens próximas do mar e portanto com níveis de sal elevados. A carne é portanto mais saborosa do que o normal (mais um DOP em potência??). O peixe fresco também é óptimo e de bebidas destaco um bom vinho tinto (de casta Chardonnay) e a bebida nacional, o Raki (parecida com a Rakija dos jugoslavos). A cultura alimentar é portanto marcadamente mediterrânica, e tambem gostam do slow food a julgar pelo tempo que demoram a servir ;)

Uma das minhas conculsões depois de vir de lá é que os tipos têm bom potencial para turismo caso limitem os problemas de crime organizado e corrupção, se desenvolvam económica e socialmente, e consigam melhorar a imagem internacional do país. Este último ponto é crucial, fala-se muito da "marca Portugal" mas comparem por favor com a "marca Albânia": nao me parece que haja muito consumidor da UE que tenha uma percepção favorável desta origem geográfica... Pode ser que a leitura deste post ajude um bocadinho!

Guezuer (saúde, em albanês) para vós!