D'APRÈS Um Vicente, algures entre LISBOA - LONDRES - XANGAI - BRUXELAS

sexta-feira, abril 29

Sino-Observações e Nanjing

Olá a partir de Hangzhou,

5o dia na China, são agora 10 da noite e a esta hora já estou em clara quebra física! Para além de me ter fartado de andar pelas montanhas nos dois últimos dias, hoje dormi pouco porque fiquei a ver o Chelsea até quase às 4 da matina (a tv chinesa transmitiu em directo o Mourinho e seus pupilos). E não valeu muito a pena, fora mais uma exibição 5 estrelas do Ricardo Carvalho não houve golos e não achei que o Chelsea tivesse jogado grande coisa. Espero que hoje o Sporting faça picadinho dos holandeses, mas infelizmente não vai dar para ver essa jogatana :(

Cheguei ontem a mais uma pequena cidade do centro da China (cerca de 6 milhões de habitantes, tal como Nanjing - ambas cerca de metade de Xangai) por onde me vou quedar pelos próximos dois dias. Mas esta cidade não tem nada a ver com Nanjing, é super ordenada, bonita e diria mesmo que quase se assemelha a uma cidade europeia. Fica localizada a cerca de170 km a sudoeste de Xangai e as maiores atracções têm a ver com o magnífico lago e as montanhas que o rodeiam, onde se localizam diversos templos budistas, pagodes, campos de chá (prometo que vos trago o melhor que puder, nomeadamente ao SR que já pediu) e outras delícias que ficarão para o post de amanhã. Só vos digo e que tem sido um enorme privilégio conhecer o que tenho vindo a conhecer nestes dias com a minha super-guia!

A China tem-me estado a surpreender pelo desenvolvimento que tenho visto. Atenção que me refiro a esta parte do país, que está entre as 2 ou 3 mais ricas! Nas duas viagens inter-cidades que fiz até agora, fi-lo em transportes de excelente qualidade:

- De Xangai a Nanjing viajei num comboio novo cuja velocidade média rondou os 150 km/h ao som do "Bridge over troubled water" do Paul Simon e outras músicas do género. Fui parte da viagem a conversar com dois businessmen, um sul coreano e um chinês, que iam fazer contactos com clientes em Nanjing. A conversa foi tipicamente sobre economia, o estado actual da chinesa, coreana e da europeia. Eles perguntavam um ao outro quantas horas por semana trabalhavam e ambos chegaram à conclusão que não estavam ao nível dos americanos ou japoneses apesar de dizerem trabalhar mais de 45 horas por semana! O chinês trabalhava para uma empresa de super-condutores e o coreano em trading (de quê nao sei...), o qual se saiu com a frase de que é muito fácil fazer dinheiro, não tem segredo nenhum. Eu não lhe respondi, só sorri e pensei para mim que gostava de dizer uma destas com aquela confiança! Mas gostei de falar com eles!

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- De Nanjing a Hangzhou viajei de camioneta, sempre com ar condicionado (importantíssimo porque têm estado temperaturas de mais de 30 graus e com a humidade que faz custa andar na rua ao sol!) e com intervalo entre bancos "à minha altura" (o que não é facil arranjar em qualquer lado, seja em Portugal ou outro), sempre por autoestrada. A única coisa menos positiva foi o facto de os condutores de pesados por estas bandas encostarem todos à esquerda e ser preciso umas boas buzinadelas para saírem da frente. E assim é dificil cochilar, pois claro!

Hangzhou está cheia de centros comerciais, zonas de lazer, jardins e uma zona de bares e restaurantes perto do lago onde tenho ido comer por tuta e meia e que é excelente. Isso é outra coisa óptima, aqui é tudo bastante barato.
Comer tambem tem sido um prazer, já deu para experimentar até agora sapo, pombo, tartaruga, caracóis e quero ver se ainda lhe dou no cão ou no gato :)

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Enfim, ando de barriga cheia. Só os pequenos almoços é que são demasiado esquisitos para mim, café só com leite e de pacote, sumo de laranja só aquecido, não há um pãozinho ou queijinho ou presuntinho de manhã e prespegam-me com arroz frito, "porridge" de arroz com salgados e outras cenas nefastas!

Mas ainda vos queria escrever mais qualquer coisa acerca da última cidade que visitei,

Nanjing

Observações

Como vos disse em post anterior aquele centro da cidade é uma confusão tremenda! As figuras mais castiças sao os ciclistas, alguns tipos incluem:
- O ciclista que carrega 4 bilhas de gás na parte de trás da bicicleta ou barras de ferro 2 vezes maiores que o comprimento da dita
- O ciclista que usa máscara de enfermeiro para se proteger da tremenda poluição
- O ciclista que tem uns óculos de sol do tamanho da cara, porque faz um calor do caraças naquela terra

Mas o curioso é que a atmosfera muda bastante entre a noite e o dia. À noite, com menos trânsito e pessoas na rua, e os néons e placards publicitários gigantes acesos nos edifícios mais altos (a presença de empresas e comércio de marcas internacionais é muito forte por todo o lado!!), a cidade fica com um ar mais civilizado a atraente. Acho que é um bocado assim na maioria das cidades asiáticas e o mesmo (nas devidas proporções) se passa com Xangai.

Outra observação é a de que todos os táxis têm uma placa de plástico que rodeia apenas o lugar do condutor (e é o mesmo em Xangai e em Hangzhou). Parece que é para se protegerem de clientes potencialmente perigosos (ou vice-versa...). Outros dois pormenores: todos os taxistas usam luvas brancas, e todos os taxis têm um taxímetro que emite recibo automaticamente. Cool hum?

Politica e monumentos

Ontem a minha presença ilustre e da Lu em Nanjing coincidiu com a presença do presidente do Kuomintang (um partido de Taiwan) na mesma cidade. Parece que foi a primeira vez que um alto dirigente de Taiwan visitou a China continental nos últimos 50 anos, pelo que ontem de manhã a cidade estava num burburinho e só se falava do assunto das notícias nacionais. Entre visitas a Pequim e Xangai o tipo resolveu comecar o seu périplo por Nanjing para prestar homenagem ao fundador do seu partido que está sepultado num mausoléu fantástico, o qual fica localizado numa área verde enorme num extremo da cidade (tipo Monsanto). Ora, sem sabermos eu e a Lu entrámos nessa área verde para visitar os monumentos por lá existentes (todos a roçar o deslumbrante) e damos com um enorme amontoado de pessoas, câmaras e camionetas de tv, jornalistas e a parafernália do costume nestas ocasiões. O tipo estava a discursar no fim da sua visita ao mausoléu e fomos ouvir um bocado (a Lu a traduzir pois está claro!) e tirar umas fotos de ocasião.

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No mausoléu, uma estutura tipo subida às pirâmides aztecas no México em que no cimo está o edifício com o túmulo, está sepultado o Sun Yat-Sen que foi o fundador do KMT.

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O tipo era um médico que se tornou político no fim do séc. XIX e lutou muito contra o sistema imperial/feudal da China nessa altura (ver "O Ultimo imperador" do Bertolucci). Ele andou pela Europa e Japão e admirava muito as ideias da Revolução Francesa, pelo que se está mesmo a ver que queria implantar as ideias republicanas na China. Ele é conhecido pelos "3 principios do povo": democracia, nacionalismo e interesse público (e por isto é tambem muito respeitado pelos comunistas). Claro está que nessa altura a confusão politica na China era enorme, houve vários dirigentes no poder e não havia propriamente um país unido - no sul os republicanos ganhavam influência enquanto no norte (todo o território acima do rio Yang-tsé, que desagua em Xangai) as facções ligadas aos senhores da guerra controlavam o esquema (depois da derrota na guerra do ópio em meados do séc. XIX e das concessões aos estrangeiros em Xangai, o espírito nacional chinês estava completamente em baixo e o Sun lutou por recuperar a "força moral da nação"). A partir dos anos 20 o KMT passou a governar a China com o sr. Sun a presidir a partir da cidade de Nanjing. Mas os seus sonhos foram interrompidos em 1925 quando morreu - nessa altura o KMT mandou construir na cidade os monumentos magníficos que visitámos, não só o mausoléu (que esta cheio de símbolos do KMT, o sol branco sobre fundo azul que tambem consta da bandeira de Taiwan) como também uma área com um templo budista e um enorme edifício que os chineses chamam pagode. Este foi erigido em homenagem aos mortos pelo KMT na guerra civil que poucos anos depois estalou com o partido comunista, o qual foi ganhando muita força com o passar dos anos até à 2a guerra mundial. Achei também piada a várias esculturas de animais à volta destes templos e edifícios, alguns de estilo Ming :)

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Por essa altura o Chiang Kai-Shek já tinha ganho proeminência (era um militar e os militares ganham sempre proeminência em situações de conflito, muitas vezes até os causam para o conseguirem...). A luta entre os 2 partidos é interrompida com a invasão japonesa, e ambas as facções juntam-se e lutam contra os mauzões nipónicos (ainda hoje se fala nisso como uma semente de cooperação para o futuro próximo entre Taiwan e Pequim) de onde saem vitoriosos. Depois do fim da 2a guerra voltam "à porrada" e os comunistas tomam conta do país em 1949 com o Mao, enquanto o Chiang foge para Taiwan com o seu exército, o corpo político do KMT e muito povo (que se juntou aos habitantes nativos de Taiwan que lá existiam). O resto da estória é conhecida (apoio dos americanos na guerra fria e até hoje, parlamento democrático e vários partidos implantados, desenvolvimento económico...), o KMT não está interessado na independência da Formosa até aos dias de hoje (são outros os partidos que a defendem, nomeadamente o que está agora no poder) porque me parece que o sonho deles é voltar a ser um dia o partido de poder em toda a China. O presidente actual do KMT (Lien Chen) veio agora à China a convite do Hu Jintao para ajudar a pacificar as relações dos dois lados do estreito e porque ele está na oposição agora e o Hu deve estar a querer tirar força ao actual PM em Taiwan. É o jogo político, mas em todo o caso o Chen tem feito uns bons discursos, ainda hoje na Universidade de Pequim fartou-se de falar em aproximação e cooperação entre os dois países, nas virtudes da democracia e mudança na China sem nunca confrontar directamente o governo chinês - o tipo é um orador muito hábil e sabe "jogar", pelo que não foi de estranhar o interesse com que os "populares" o receberam em Nanjing e que têm no KMT. O meu feeling pessoal a partir desta minha estada por cá é que se no futuro houver multipartidarismo na China (evoluírem para um modelo do tipo ocidental) só há duas hipoteses de haver grandes partidos: ou há uma cisão no PC e criam-se dois partidos fortes a partir das diferentes alas hoje existentes, ou então o KMT volta à cena chinesa e torna-se ele próprio um grande partido (porque tem história e tradição) de estilo social-democrata ou socialista. Como dizia um professor que tive(mos), "a História faz-se com as ideias disponíveis" e no presente não me parece haver muitas ideias distintas para se formar um novo partido forte. O que os meus amigos chineses dizem é que o cenário de democracia ainda esta muitíssimo longe de se concretizar, nao deve ser nas próximas dezenas de anos...

Mas as relações comerciais e políticas entre China e Taiwan são cada vez mais intensas e frequentes, os empresários taiwaneses têm investido muitíssimo na China continental e deve ser por aí que a integração se vai fazer. Um exemplo é o da mudança nas políticas agrícolas, com a China a propôr abrir o seu mercado interno às exportações de frutas taiwanesas porque a época de produção em Taiwan corresponde ao pico da época de consumo na China (e também porque os agricultores taiwaneses são dos principais apoiantes do partido pró-independentista agora no poder...). O que a China está a fazer em relação a Taiwan é o mesmo que está a fazer em relação a vários países asiáticos: cada vez uma maior abertura dos mercados, IDE e cooperação em muitas áreas (chamam-lhe parcerias estratégicas, tipo as que a UE faz com os paises do norte de África, Médio Oriente e Leste, ou seja, políticas de boa vizinhanca para evitar tensões), para ser aceite, continuar a desenvolver-se e no futuro ganhar ainda mais influência no "xadrez" da Ásia em comparacao com o Japão. Uma imagem disto é a roda viva de visitas que os altos dirigentes chineses tem feito esta semana:

- Passado fim de semana na conferência de Bandung (Ásia e África)
- No princípio da semana na Indonésia, que era grande aliado dos EUA na região e criticava muito a China, mas o Bush parece que anda mais preocuopado com o Iraque e a Europa pelo que a Indonésia se está a voltar um pouco para a China (promessas de IDE no sector mineiro, da energia e maior abertura no comércio)
- A meio da semana nas Filipinas (que faz parte da zona de comércio livre ASEAN) para mais acordos de cooperação, nomeadamente para explorar petróleo e gás natural no Mar do Sul da China juntamente com o Vietnam (dependência a mais do Médio Oriente não é bom)
- Hoje não sei que ainda nao vi as notícias (a propósito o canal CCTV 9, num inglês correctíssimo, é óptimo, é tipo sic notícias; é claro que não há debates com diferentes pontos de vista sobre a situação interna da China, mas é muito informativo e traz sempre aos debates sobre as questões internacionais da Ásia uns académicos e políticos, Chineses e estrangeiros, bastante interessantes; e os documentários sobre a China, diferentes culturas e regiões também são fixes tal como as business news - será que em Portugal não podíamos também ter um canal no cabo em inglês para se perceber melhor lá fora os que se passa no nosso pequeno mas espectacular país???)!

Outra questão, e para terminar com estas observações sócio-políticas, é a relação com o Japão. Acho que é uma coisa tipo França e Inglaterra, ou Áustria e Itália (para não dizer Portugal e Espanha, que é politicamente incorrecto hoje em dia...). Há feridas do passado ainda relativamente recentes (2ª guerra), há questões no presente (disputas territoriais e livros de história) e problemas para o futuro (jogo de influência na região, militarização de ambos os países e quejandos). Na polémica recente, por exemplo, a China acusa o Japão de não ter feito como a Alemanha depois do Hitler, ou seja, a classe política daqueles tempos ter sido completamente afastada da esfera do poder tal como as ideologias nacional socialistas o foram (ver o filme alemão "A Queda", por favor, bem como o Imperial War Museum em Londres quando puderem, ambos imperdíveis!). No Japão manteve-se o sistema imperial que perpetuou a mesma classe dirigente nas esferas do poder, e há o medo que a candidatura a membro permanente do Conselho de Segurança da ONU traga nova militarização do Japão, dê força às alas mais à direita ligadas ao Exército e mudem a política pacifista que os nipónicos têm adoptado desde o pós-guerra (claro que a China não pode falar muito já que anda a investir bastante em armamento, mas como esteve do lado dos vencedores...). Também pode ser que a polémica seja toda por causa dos recursos energéticos disputados por ambos os países... Segundo parece os EUA também estão a rever a sua política geoestratégica no sentido de dar mais força ao Japão e perturbar a evolução da China; a(s) Coreia(s) é(são) o queijo no meio da sandes e corre(m) algum risco de ficar no meio da luta de influências entre dois pesos mais pesados.

Com a UE há agora a estória dos têxteis, vamos ver ainda no que vão dar as birras dos franceses e dos chineses... Comércio livre, comércio livre o caraças, da-ssssee!!!!

Bom, chega de políticas, próximo post sobre a fantástica cidade de Hangzhou. Vou partir amanhã e com pena :( Nunca tinha ouvido falar desta cidade e saio daqui um enorme fã!! Vou é ter que deixar para amanhã que já se faz tarde.

Bao Yibao (abraço no dialecto xangainense) por hoje

PS1: sempre que um chinês olha para mim e descobre que sou português fala imediatamente em futebol! É actualmente a nossa imagem de marca, pelo menos por estas bandas onde não se aprecia Vinho do Porto (bárbaros...)! Já me disseram que sou parecido com o Figo, e há bocado disseram que me parecia com o Rui Costa. Não sei se isso é bom ou mau actualmente, acho que preferia que me chamassem Mourinho! O problema é que o conhecem por cá mas não sabem que é português! Quando voltar a Xangai escrevo mais sobre coisas portuguesas na Ásia, e há alguma coisa a dizer!!

PS2: acho que consigo receber comments ao blog no meu hotmail, pelo menos recebi um da barrigadura e outro do SR, aos quais posso dizer que seguirei as respectivas sugestões (comboio e chá). Espero bloggar umas fotos no fim de semana.

PS3: Spoooooooooortinnnnggggg!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

quarta-feira, abril 27

O George tinha razão!

Chi-le-ma caríssimos
("Já comeram?" traduzido à letra - é uma forma de cumprimento chinesa equivalente a "Como estão?")

Estou hoje a escrever-vos de Nanjing, uma "pequena" cidade de 6 milhões de habitantes localizada a 300 km de Xangai para o interior oeste. Descobri que a província onde fica localizada Nanjing (Jiangsu de seu nome), uma das mais pequenas do país em termos territoriais, tem uma população total de 60 milhões de pessoas. Ora isto é o tamanho do Reino Unido, e é maior que Portugal e Espanha juntos! Daí que só agora entenda verdadeiramente a frase desse grande visionário incompreendido que é George W. Bush: "A China é um pais cheio de chineses"! Chamo a atenção para a subtileza com que ele utilizou o "cheio de", ele sabia bem do que estava a falar! Nunca vi tanta gente junta! As ruas são uma confusao inimaginável, pessoas a andar no meio da estrada, bicicletas e motoretas eléctricas nos passeios, carros sempre a buzinar e em ultrapassagens de meter medo. Xangai já era a puta da confusão, mas isto... E a poluição atmosférica é demais, deve ser a rinite geral!

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Também acho que não devem vir aqui muitos ocidentais pela cara com que olhavam para mim, acho que nem no Togo me senti tão bicho raro (tipo caniche cor de rosa !).

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Para além disso o pessoal aqui tem um ar um pouco "rural". A cidade também parece um estaleiro, está tudo em construção, parece que vão receber um evento nacional importante no verão. É também das cidades mais quentes da China por ficar localizada num vale rodeado de montanhas.

Uma das razões pelas quais Nanjing e relativamente famosa no contexto da China é pelo facto de ter sido capital do país entre 1911 e 1949 quando voltou a ser Pequim (deixou de ser depois do ultimo imperador). Os fundadores e a sede do Kuomitang (partido do Chiang Kai-Shek, o que fugiu para Taiwan depois da revolução do Mao) são aqui, e visitei hoje o local onde o ideólogo mítico da democracia republicana na China (um tal de Sun Yat-Sen) viveu e exerceu o poder até morrer, no centro da cidade.

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Por ser a capital durante a 2ª guerra, Nanjing foi super afectada pelos japoneses, os quais se instalaram na cidade depois de a bombardearem e não trataram muito bem os nativos (nomeadamente as mulheres, das quais fizeram "damas de companhia" à força). Parece que é dos sitios na China onde têm mais ódio aos nipónicos, a par com a zona nordeste (Manchúria) e Xangai que foram invadidas e ocupadas na 2ª guerra.

Amanhã vou para Hangzhou que, segundo dizem, é o paraíso na terra. Confirmaremos (ou não...)!


Ni hao por hoje



PS: Devo-vos dizer que não tenho acesso à minha página do blog. Consigo entrar no blogger.com, editar o texto, pôr umas fotos mas não as consigo ver nem ao texto. Se as fotos do post anterior estiverem muito pequenas ou grandes lamento mas é difícil corrigir. Também praticamente não tenho acesso a sites estrangeiros (bbc, cnn...), só ao Público e Expresso. Curiosamente também não a nenhum dos jornais desportivos nacionais :) É mesmo limitante viver por cá em termos de acesso ao que se passa no resto do Mundo.

terça-feira, abril 26

Primeiras Impressões

Peng You (Caros amigos)

Conforme prometido cá estou eu a enviar a primeira comunicação a partir desta enorme cidade de Xangai. Neste primeiro post vou apenas dar-vos conta das minhas primeiras impressões, que na minha opinião são na maior parte das vezes pouco correctas e enviesadas, mas que reflectem o meu estado de espírito e o que observo nesta cidade tão longe do mundo ocidental. Se estas mini-crónicas forem escritas um bocado em bruto não se admirem, é porque não tenho muito tempo para escrever ou há dificuldades técnicas.

Chegada

A partir do avião, antes de aterrar, deu para ter uma boa visão dos arredores de Xangai, nomeadamente do rio Yang-tsé que desagua na cidade vindo do interior do territorio chinês. É um rio castanhíssimo (poluição ou cor natural devido ao transporte de terras?), perto dele o Tamisa ou o Tejo são uma limpeza, mas com muitos barcos de transporte de mercadorias a navegar ao longo dele.

O aeroporto internacional de Pudong (um dos dois que serve a Xangai, o outro é para vôos domésticos) e as vias de acesso ao centro da cidade são bastante moderno(a)s, muito mais que o que vi em Belgrado, por exemplo.

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Ao longo da via rápida que liga ao centro circula um comboio de alta velocidade (o Maglev). Há muitas empresas multinacionais estabelecidas ao longo desta via (Sharp, Volkswagen, Canon), em geral com enormes infraestruturas. O centro da cidade localiza-se a cerca de 50 km e para chegar aos subúrbios (onde estou instalado) demorei cerca de meia hora. A Volkswagen deve quase ter o monopólio por aqui, mais de 50% dos carros são desta marca, mas de modelos não vistos em Portugal ou Inglaterra. A maioria dos carros na estrada são do modelo Santana (curioso hã, nome português!) 2000 ou 3000.

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O jet-leg é lixado! O meu sono está completamente desregulado. Nas 10 horas de viagem só devo ter dormido cerca de duas, e só houve cerca de 4 horas e meia de noite, já que ao viajar da Europa para a Ásia atravessámos a zona de noite do planeta no sentido contrário. Depois de partir de Londres, às 4 da tarde, cheguei a Xangai às 11 da matina (3 da manhã em Lisboa), fui almoçar e depois do almoço deu-me uma tosga do caraças!! A Lu disse para eu não dormir mas estava mais para lá do que para cá. Consegui resistir até às 10 da noite. Hoje (segunda) acordei antes das 5 da manhã (9 da noite de domingo em Lx) e já não consigo dormir, não sei como vai ser esta noite...

Estou alojado na casa dos pais da Lu, nos subúrbios de Xangai.

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É uma zona de prédios bastante altos, parece o Barreiro ou os arredores de Lisboa mas mais velho, com edifícios mais feios. Os edifícios da zona podem ser divididos em 2 estilos: aqueles que têm aquele ar e estilo "bloco de Leste", boa parte deles construídos antes dos anos 80: e os mais recentes, construídos depois de 2000 e muito parecidos em estilo e altura com Massamá, Telheiras ou o Cacém e as Mercês. Mas se acham que os patos bravos tinham mau gosto deviam ver a construção estatal aqui! Muitos prédios novos estão em construção actualmente, a área urbana de Shanghai está a expandir-se a grande velocidade segundo a Lu, e não da forma mais harmoniosa (ao contrário do que se vê em Londres). É só betão! Suponho que seja o mesmo que em Lx, prédios novos, confortos no interior das casas (é o que as pessoas querem!) mas nos espaços públicos é a miséria (o que vale é que aqui apenas uma em três famílias tem carro, está fora das possibilidades de compra de boa parte das classes médias, daqui por uns anos vai ser o caos). O mercado de compra e venda está "buoyant", continuam a chegar pessoas de regiões do interior da China para a cidade à procura de emprego, e a população total já passa dos 13 milhões de almas.

O trânsito é uma confusão, montes de bicicletas que transportam tudo (mudanças de casa) e motoretas que levam em cima sempre 2 ou 3 pessoas. O respeito pelos sinais não é muito, mesmo que esteja vermelho, se não vier ninguém é mesmo para passar! É sempre preciso ter cuidado com as bicicletas e pessoas que se atravessam à frente a toda a hora.

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TV

Os canais de TV são quase todos estatais (o CCTV, Central Chinese TV) e um deles é internacional, em inglês. É bastante interessante ver as notícias pelo lado deles, o tema mais em foco por estes dias são as relações com o Japão. Mas também falam muito do business, os lucros das empresas e as relações com a OMC. Para todos os efeitos a China parece ser neste momento uma economia de mercado a funcionar, apesar do PC no poder. Crescimento este ano acima das previsões, 9,5%, têm que arrefecer um pouco a economia senão a inflação vai atacar!

Também se fala bastante da conferência de Bandong, a 2ª entre os países da Ásia e África, a primeira foi há 50 anos (movimento dos países não alinhados no contexto da guerra fria, apenas 26 países participaram, onde sobressaíram figuras como o Nehru ou o Sukarno). Foi muito interessante assistir a um debate acerca da importância desta cimeira, o que significou há 50 anos (processos de descolonização, autonomia dos países do 3º mundo em relação às potências ocidentais e ao bloco soviético, situação fechada da China) e o que significa agora (reforço do multilateralismo contra o unilateralismo americano, relações sul-sul, cooperação e desenvolvimento, crescimento e desenvolvimento económico, voz autónoma destas regiões do Mundo no contexto das relações internacionais e estímulo à reforma da ONU a decorrer em Setembro, especialmente no que diz respeito ao conselho permanente e membros que o compõem). A conferência só se pode voltar a realizar tanto tempo depois principalmente por causa do fim da guerra fria, da maior abertura e interesse activo de países como a China, Índia e Indonésia à globalização, 109 países participaram! Eu registo é que, apesar de ser extremamente positivo este movimento, em todo o debate não se falou em 2 conceitos para nós tão fundamentais: a democracia e os direitos humanos. Os princípios fundamentais da conferência são exactamente a não interferência nos assuntos internos de uns países pelos outros, o respeito pelas soberanias e culturas específicas de cada país e blá-blá-blá. Enfim, para muitos dos líderes dos países africanos e asiáticos há coisas muito mais importantes que democracia, e com o progresso económico no topo da agenda as questões sociais ficam para trás.

Um pormenor muito curioso da TV chinesa é o facto de na previsão meteorológica o sol ser vermelho e não amarelo, como estamos habituados. Perguntei isto à Lu, ela riu-se porque nunca tinha reparado muito na diferença e disse que isto deve vir do facto do Mao Ze Dong sempre falar do Sol vermelho e dos amanhãs que cantam... O que é giro é ver numas notícias com um formato tão BBC/CNN simbologias a puxar para o comunismo, é só uma imagem do que é a China no presente, cheia de paradoxos...

Próximos dias

Amanhã vou a Nanjing, a cidade que foi mais bombardeada pelos japoneses na 2ª guerra mundial. A memória das população de lá é tipo Londres durante o Blitz, mas com montes de violações e matanças a sangue frio à mistura. Vamos ver se consigo enviar fotos de Nanjing, que hoje esteve difícil usar o photobucket.

Em jeito de balanço, os dois primeiros dias foram óptimos, estou a gostar bastante. No próximos dias digo mais qualquer coisa.

Yong Bao (Abraço)

sábado, abril 23

Shanghai ou Xangai

Mudando de Continente, da América do Sul para o Sudeste Asiático, quero informar-vos que nas próximas duas semanas vou dar um pulo até ao outro lado do Mundo.

O destino é Shanghai (à inglesa) ou Xangai (á portuguesa), para onde o nosso muito amado PM diz querer enviar umas dezenas de portugas qualificados para aprender os segredos das altas tecnologias e dos crescimentos anuais no PIB superiores a 8%! Eu cá resolvi fazer de batedor, ir lá investigar o pedaço e estabelecer os primeiros contactos na chamada "Paris do Este". É a primeira vez que viajo tal distância (11 horas de avião e 7 horas de diferença em relação à hora Portuguesa GMT) e que vou experimentar essa bela sensação física chamada jet-lag, o que é bastante entusiasmante. Os locais que espero visitar para além de Xangai são as cidades de Nanjing, Suzhou e Hangzhou, e devo dizer que estes nomes são tão desconhecidos para mim como provavelmente para vocês.

Um dos planos que eu tenho, portanto, é escrever-vos de lá em tempo real com fotos e posts no blog. A partir de amanhã vou mudar o nome do blog para o mais ou menos óbvio "Um Vicente em Xangai" durante o tempo que permanecer por lá. Espero portanto comentários e que seja uma forma de partilhar esta experiência convosco.

O que pode acontecer é que seja difícil aceder a "essas coisas do ocidente" por lá. Sei à partida que alguns amigos chineses têm problemas em aceder a alguns blogs, e que é impossível enviar ou receber sms internacionalmente porque o mauzão do Governo chinês não permite. Mas se não houver grandes restrições domingo ou segunda escrevo-vos o primeiro post.

Ni hao!

Falando sério

Caros caras,

Depois de uma travessia do deserto mais ou menos longa, cá estou de volta ao mundo (português) dos blogs.

E se a última entrada foi dedicada a um excerto do livro que andava a ler na altura, nesta entrada vou fazer o mesmo com o livro que ando a ler no presente - "O Melhor das Comédias da Vida Privada" do escritor brasileiro Luis Fernando Veríssimo (obrigado ao SB!).

O livro é composto por umas dezenas de crónicas dedicadas às "tragédias e comédias da classe média brasileira", e parece que foi um sucesso no país do grande Lulão. O sentido de humor da escrita é tipicamente brasileiro, o sexo e as "sacanagens" que moços e moças fazem uns aos outros são o tema mais dominante, e a língua é a mesma mas o tom é claramente distinto da forma de escrever da maioria dos autores portugueses. É outra cultura, outra maneira de sentir e outra alma (português com açúcar, dizem alguns), nem melhor nem pior que a lusa, muitas vezes mais excitante e muitas outras mais cansativa (doçurinha e ternurinha a mais também enjoa).

Uma coisa que eu acho djimais é a abundância de nomes superlativos que há no Brasil, neste caso Veríssimo. Não lhe bastava ser vero, tinha que ser mais que verdadeiro, veríssimo. Há uns tempos também li que há uma avenida numa cidade brasileira (não me lembro qual...) chamada Avenida Generalíssimo Sousa. Mas que ego, carambas! Ao Sousa não lhe bastava ser um simples general, tinha que ser um tipo extremamente general!!

Queria partilhar convosco uma das crónicas (intitulada "Falando Sério"), dedicada principalmente aos meus colegas agrónomos, e acerca de um tema que está um pouco fora de moda no nosso país (no Brasil não tanto) - a Reforma Agrária. Cá vai, imaginem a conversa com um sotaque brazuca num bar dji Cópácábâná ádjimirândo á práia e ô Pão dji Áçúcárrr :-)

"Ele disse:
- Ora, reforma agrária...
Ela disse:
- Vai dizer que você é contra?
Ele tentou cair fora:
- O assunto é muito complexo.
Ela insistiu:
- Espera um pouquinho.
- Dá um beijo, vai.
- Espera. Isto é importante. Eu quero saber.
- O quê?
- A reforma agrária. Você é contra?
- Por quê? Você é a favor?
- Mas só sou.
- Você quer que o velho divida as terras dele?
- Seu pai é latifundiário?
- Tremendo lati.
- Eu não sabia!
- Tem muita coisa a meu respeito que você ainda não sabe, boneca. Vem cá que eu te mostro...
- Espera. Falando sério.
- Dá uma beijoca.
- Falando sério pomba.
- Está bem. O que você quer saber?
- Seu pai. Quantos hectares ele tem? Ou acres? É acres ou hectares?
- E eu sei? Nunca fui lá.
- Quantos?
- Um monte.
- Mais ou menos?
- Olha, eles pegam no jipe da fazenda e, num dia, não conseguem chegar ao fim das nossas terras.
- Meu Deus do céu!
- É que o jipe quebra sempre. Dá um beijo, poxa.
- Pára.
- Vem cá, mulher!
- Não vou. Olha, nunca pensei, viu?
- O quê? Que o meu velho fosse fazendeiro? Como é que você pensa que eu tou pagando a faculdade? E o carro? E o apartamento? E as nossas alianças de noivado?
- Ele tem terra improdutiva?
- Tem. Exatamente a parte que ele está guardando pra me dar quando eu casar. A nossa terra, amor.
- Mas... E o seu discurso?
- Bom...
- Até eu achava radical. E olha que eu sou meio PT.
- Não vamos brigar por causa disto.
- Tudo o que você vive dizendo. Justiça social...
- Confere.
- A insensibilidade dos ricos no Brasil.
- Mantenho.
- Os escândalos dos sem-terra num país deste tamanho.
- Sustento.
- Vem cá. Outra noite, aqui mesmo, neste bar, você disse que toda a propriedade é um roubo. Eu achei bacanérrimo.
- Foi uma frase que me ocorreu na hora. Mas escuta...
- E agora vem dizer que é contra a reforma agrária.
- Eu não sou contra a reforma agrária. Teoricamente, sou a favor.
- E então?
-Você não entende? Agora não é teoria. Agora são as terras do velho! "

Lindo, hem!?

Abraços açucarados!